segunda-feira, 14 de julho de 2008

Do sétimo andar (II)

Sem conseguir pensar em mais nada, com uma pressa desesperadora, atravessei a sala correndo em busca de alguma roupa disponível. Vesti rapidamente o primeiro jeans que encontrei e a blusa amassada que estava jogada no chão, sem preocupar-me em acrescentar sequer peças íntimas. Calcei o único tênis que havia em meu guarda-roupa e tive tempo de pegar um casaco desbotado em cima da poltrona. Com esse estilo despojado, que até parecia proposital, atravessei a porta da frente como uma bala e desci as escadas do prédio como se não houvesse amanhã. E por algum motivo que eu provavelmente nunca vou entender, em menos de cinco minutos estava em frente ao edifício vizinho do meu.

Foi então que o bom senso inundou meus pensamentos. Eu mal sabia o nome do homem, como seria capaz de invadir seu apartamento? Fui caminhando mais calmamente até a portaria. Diminuí a velocidade dos meus passos inexplicavelmente, tentando pensar em alguma coisa. Como eu me anunciaria? E mesmo se eu conseguisse subir até lá, o que diria a ele quando estivéssemos a sós em seu apartamento? E se meu plano desse errado?
"Posso ajudá-la, senhorita?", perguntou-me o porteiro, olhando fixamente em meus olhos como se eu fosse uma maluca qualquer pedindo esmolas.
"Err... eu... Eu vou no sétimo andar."
"Sim. No apartamento de quem, exatamente?", ele respondeu segurando-se para não rir. Deveria estar achando graça daquela situação desconfortável em uma noite um tanto quanto monótona. Divaguei alguns minutos em silêncio, e relembrando-me dos filmes que vira e dos livros que lera, decidi adotar um ar misterioso.
"Ah, como posso saber qual nome ele estará usando agora? Da primeira vez que o vi, chamava-se Cláudio. Na última vez que estivemos juntos, ele exigiu que eu o chamasse de Paulo. Mas se o senhor duvida de mim, eu posso descrevê-lo.. ele é alto, careca, pela morena..."
Interrompendo-me constrangido, ele retrucou: "Imagina, senhorita, que eu seria capaz de duvidar de uma dama. Se posso lhe ajudar, as pessoas, ou melhor, as mulheres que vêm aqui insistem em chamá-lo de Don. Simples assim, o que eu não entendo, porque no contrato de aluguel...", e ele continuou monologando enquanto eu ria por dentro da minha genialidade.
Quando voltei minha atenção ao porteiro, ele continuava atropelando-se em suas próprias palavras: "... mas chega a ser engraçado, não é mesmo? Ainda mais quando não se tem nada para fazer, em noites como essa. Bom, eu vou interfonar lá no apartamento dele para avisar que você chegou. A quem devo anunciar?"
Imitando o homem do sétimo andar, adquiri também outra personalidade.
"Raquel. Meu nome é Raquel.", e quase eu acreditei na minha própria mentira.
Sorri quando ele abriu o portão para mim antes de ligar para Don, e apressei-me a entrar no elevador, antes que descobrissem toda aquela farsa.


Victória Pereira Martins
06/08/2008